terça-feira, 26 de abril de 2016

20'

Eu vinho
Ele tequila
Eu pentax
Ele rolleiflex
Eu gosto de comer ele de pé
Ele deitado
A gente se entende assim
Meio torto
Meio cambaleando
Sem Beijos
Nem endereços
Somos nós
O nada que deu certo.


Eu vinho
Ele tequila
Eu pentax
Ele rolleiflex

Olhos
Olhos
Malditos olhos
Olhos que eu quero
Olhos que não me querem

Ele
Ele e suas coisinhas
Ele neurastênico

Ele pelado.

segunda-feira, 25 de abril de 2016

Por que os olhos pesam quando a gente sente sono?

E o mundo cala quando se quer gritar?

Por que as olheiras fundas refletem longas noites de insônia?

E as cicatrizes no braço esquerdo revelam um passado de condenações?

Por que essas amarras da minha existência me prendem de tudo que eu sempre acreditei?

Por que as ordens de despejo sempre vem quando não se tem pra onde ir?

Por que marinheiro não sente saudade?

As velas que eu acendi aos seis não me deram sorte


E as minhas dores me fizeram forte.

sexta-feira, 22 de abril de 2016

Sobre ausência no peito do toque de mão que eu não deveria ter lavado.

Phedra D. Córdoba  (Havana, 26 de maio de 1938 — São Paulo, 9 de abril de 2016) foi uma atriz cubana.

Na infância, chamava-se Rodolfo. Entrou para uma companhia de dança na adolescência, formando uma dupla com a bailarina Lupi Sevilha. Participou de uma turnê da companhia pela Argentina em 1958, e então conheceu Walter Pinto, que a convidou a desistir de voltar para Cuba e ficar no Rio de Janeiro. Abandonou definitivamente o nome e a identidade masculinas aos 21 anos de idade.

Assumindo o nome artístico de Phedra de Córdoba, trabalhou no espetáculo de travestis Les Girls. Atuou como vedete ao lado de Costinha. Em 2003, entrou para a companhia de teatro Os Satyros .

Morreu em decorrência de um câncer, no dia 9 de abril de 2016.





Na ânsia de mudar uma coisa, qualquer coisa, juntei as moedas soltas pelos cinzeiros da casa, esvaziei os bolsos dos meus avós. Era tudo que eu precisava, nunca fui dono de grandes posses tampouco menestrel de grandes furtos, talvez uns antúrios no jardim da vizinha aos seis anos ou uns livros na biblioteca da escola, mas nada muito calculado.

Não contei quanto tinha em mãos, sai, apenas sai, com os lábios secos, beber água era perigoso, nunca tinha sentido fagulhas assim de liberdade e qualquer passo fora do previsto soava catastrófico.

Caminhei até o ponto, em silêncio, era necessário o silêncio no atual estado da condição. Minhas mãos trêmulas acenaram para o primeiro ônibus que passou, tirei a terra das calças e subi me segurando com convicção no corrimão de entrada, encarei o motorista como quem tem o controle da situação e fui. Algumas moedas sobre a roleta, dispenso o troco, gira, procura um lugar no fundo, perto da janela e observe a paisagem com deslumbre. As casas de taipa, os becos escuros, as pretas e seus vestidos floridos carregando com essa força feminina de quem carrega o mundo nas costas um balde cheio de roupas para serem estendendidas, grita com o menino que atrapalha a passagem com o pião. O boêmio alcoólatra e sua camisa florida parafraseando um samba qualquer enquanto os dedos ensaiam o compasso da melodia na taberna de um bar. As putas frígidas e sua maquiagem carregada num malabarismo incerto das mãos de unhas mal pintadas: um copo de gim e um cigarro enquanto conta notas de cinco.

O trânsito e sua caótica e pontual melodia.

Tenho compromissos inexistentes e não posso me atrasar, e nessa espera observo. Observo o vendedor de balas lendo a bíblia no ônibus enquanto limpa o suor decorrente do estresse da espera, com um lenço laranja. Observo as secretarias exaustas e seus coques exuberantes falando sobre os números da bolsa (a de valores). Observo inquieto e aflito minhas pequenas obsessões na observação alheia. Caio foi de paris até Viena de ônibus, não porque estava falido ou com pouca grana, ele assim como eu gostava de observar e talvez por isso e só por isso eu escreva isso.

E é chegado o ponto, puxo três vezes a corda de parada para me certificar de que estou no horário certo para o meu compromisso inexistente e inadiável e que nada nem ninguém vai atrapalhar. Desço saltitando nos anseios de menino, dou passes tão breves que soam imperceptíveis, e lá está ela, na praça, exuberante com suas castanholas falando sobre cuba libre com sotaque castelhano e feições santas de índia meio Brigitte Bardot com o cabelo impecável como o de Jane Fonda em amargo regresso.



Nessa noite eu não rezei.

terça-feira, 19 de abril de 2016

Não suportei teu ascendente em câncer e fui (de forma covarde) mas te deixei um bilhete.


Por que você treme as mãos quando segura a câmera?

Gosto quando tua pele ganha esse tom avermelhado de sol

Aposto que teus pelos de baixo herdaram essa coloração clara das tuas sobrancelhas

Gosto quando você levanta a barra da calça até os joelhos e coloca os pés no mar

Gosto da forma desajeitada quando tu perde informações

Gosto das curvas das tuas costas no meu colchão

E desse teu ar de ''não sei pra onde ir''

Gosto da tua camisa da evita

E da forma que tu cruza as mãos num momento de oração

Até breve querido





Vinícius.

quinta-feira, 14 de abril de 2016

lápide.

Truffaut me ensinou que a fineza vem do mistério, mas o que se há de fazer quando se sente muito triste? Acender um cigarro? Colocar um tailleur preto simbolizando o luto pelo meu desamparo emocional? Já fiz, e não adiantou muito, minhas mãos tremem quando me encontro em estado de profunda tristeza e não fico muito bem com tailleur.

Ligar para os mais íntimos e passar horas a fio tecendo palavras vazias enquanto enrosca o fio do telefone nos braços recém cortados por ela? Já fiz também, e não adiantou muito, sempre tive preguiça de falar e não tenho muitos amigos.

O fato é, por onde eu caminhe ela sempre vai me acompanhar, isso é eminente. Meu analista esses dias me perguntou o que me impedia de ser feliz, não respondi, fiquei meia hora de braços cruzados sobre o divã pensando sobre, e até o atual momento não encontrei respostas. Talvez seja da minha natureza, ou da dos que me antecedem, minha bisavó Lurdes que o diga, insatisfeita com essa vida vazia de filha de imigrantes e marido metido com coronelismo no Piauí suicidou se, sem pena, doze comprimidos pra pressão alta e acordou fria como um cálice, nas costas deixou seis filhos e a vontade de ir.

Também tenho vontade de ir, uns dias mais outros menos, ainda assim ir, ainda não encontrei minha maneira. Mas ao contrário de Lurdes não deixo nada, talvez o lapso de quem sente muito e um livro surrado de duzentas páginas que escrevi e não publiquei.

terça-feira, 5 de abril de 2016

retrato de um quadro sem moldura

Devolve o meu casaco favorito
Com a tua pele
Colada nele

Esvazia meus cinzeiros
Eu não aguento essa espera
Então fumo

Sexta feira tomei um ônibus, sem destino, passava no ponto da escola que eu estudei quando tinha seis anos
Três pontos a frente
Um travesti entrou
Careca
Vestido florido largo até o pé
E uma mala
Ordem de despejo supus
Acendi um cigarro antes da porta abrir no ponto final
E fui
Não te encontrei.